O bolo de rolo é uma das mais generosas tradições de
Pernambuco.
E merece reverência. Por isso é preciso cuidado com afirmações
apressadas sugerindo que sua receita deriva do rocambole. A tese não se
sustenta. Por ter chegado o rocambole, aqui, bem depois de nosso bolo de rolo.
E por serem, no preparo, bem diferentes.
No recheio - que o rocambole pode ser
feito com muitos, entre eles especialmente doce de leite, chocolate e coco;
enquanto bolo de rolo apenas usa goiabada.
Na massa - que o rocambole se faz
como o pão de ló; enquanto bolo de rolo segue o colchão de noiva, receita
originária de Tavira (distrito de Faro, região do Algarve), um dos primeiros
bolos que se fez "enrolando" uma massa recheada.
E, sobretudo, na
maneira desse enrolar, que "no bolo de rolo vão quatro lâminas de
massa" enquanto "no rocambole, apenas uma" - como bem disse, na
revista Gosto (nº3), J. A. Dias Lopes.
Bom lembrar que, nos tempos em que o bolo de rolo já
freqüentava nossas mesas, ainda não havia nascido o Visconde de Ponson Du Terrail
(1829-1871) - dado, pelas crônicas da época, como "atrapalhado e
prolixo".
Dele até se contava que costumava escrever com pressa e não
relia seus escritos, vício que o levou a deslizes monumentais - como o de dizer
que "as mãos estavam tão frias como as duma serpente".
Seu personagem
Rocambole, não por acaso, é confuso e enrolado - imagem e semelhança do próprio
autor. Talvez por conta disso tenha emprestado o nome à sobremesa. Mas só no
sul do Brasil, bom lembrar; que, em outros cantos, receitas similares recebem
nomes diferentes.
Na França, por exemplo, mais conhecidas são "roulé aux
dattes" (massa seca e fina com recheio de tâmaras) ou "bras de
Vénus"(pão de ló com creme de funcho); na Alemanha, "strudel"
(massa filo com recheio de maçã, passa e canela); na Hungria,
"retes". Todas, herança do "baklava" turco (massa folhada
recheada com amêndoas ou nozes).
Em Portugal e demais países de língua
portuguesa, esse tipo de bolo mais comumente recebe o nome de "torta"
- com destaque, entre elas, para as "de laranja", "de
segredos" e "de claras". Faltando apenas dizer que esse mesmo
rocambole, não se sabe por que, batizou também uma espécie de alho de bulbo
vermelho conhecido como "alho de Espanha". Tudo lembrando as palavras
do grande pernambucano Marcos Vilaça, presidente da Academia Brasileira de
Letra, "o bolo de rolo nada tem de rocambole".
Mais provável é que as damas portuguesas sentiram, naqueles
primeiros tempos, enormes dificuldades para executar algumas de suas receitas -
dado não terem, à mão, o que usavam na Europa distante: amêndoa e pinhão; maçã,
marmelo e pêra; canela, cravo e gengibre.
Passaram então a experimentar
ingredientes dessa terra, para elas nova, modificando boa parte de suas
receitas originais. Assim, provavelmente, nasceu nosso bolo de rolo.
Uma
adaptação do colchão de noiva português. Até porque, fosse inspirado no
rocambole, e teria inevitavelmente usado a receita do pão de ló, chegado ao
Brasil nos primórdios do séc. XVII - e reproduzido, até hoje, sem nenhuma
variação.
De resto, nosso bolo de rolo já se fazia, por aqui, bem antes de
nossa cultura sofrer as interferências do francesismo.
É que, nesse tempo,
"as tradições portuguesas de bolo e de doce tinham se instalado tão bem
nos fornos das casas-grandes de engenho e de alguns conventos de freiras, que a
influência francesa só as atingiria de maneira mais viva no século XIX, quando
os confeiteiros franceses começaram a se tornar chiques na Corte e no
Recife", ensina Gilberto Freyre (em "Açúcar").
E tudo só depois
da chegada da família real, em 1808.
Assim, e diferentemente do que imaginam o
pâtissier paulista Flavio Frederico (revista Gosto nº3) e tantos outros, nem
"todo bolo enrolado, vira automaticamente rocambole".
Alguns até
podem ser, vá lá. Mas bolo de rolo não. Bolo de rolo é bolo de rolo só, e ponto
final.
RECEITA: BOLO DE ROLO
INGREDIENTES:
250 g de açúcar
250 g de manteiga
6 ovos
250 g de farinha de trigo
Sal
½ lata de goiabada
1 copo de água
½ xícara de açúcar
PREPARO:
Bata bem açúcar e manteiga.
Junte as gemas, uma a uma.
Acrescente o trigo
peneirado, o sal e misture delicadamente.
Depois junte as claras em neve.
Divida a massa em cinco partes iguais.
Coloque cada uma em assadeira rasa,
untada com bastante manteiga e polvilhada com trigo.
Asse rapidamente, uma de
cada vez, em forno quente.
Prepare o recheio misturando goiabada, água e açúcar no
liquidificador.
Leve ao fogo até ficar um creme homogêneo.
Reserve.
Desenforme, virando a assadeira em toalha polvilhada com
açúcar.
Recheie com a goiabada derretida e enrole rapidamente, com
ajuda da própria toalha.
Repita o processo até a última camada.
Coloque no prato de servir e polvilhe açúcar.
Fonte: Terra Magazine