O tema é delicado para a maioria dos adultos, mas faz parte
da curiosidade dos pequenos. Confira nossas dicas para abordá-lo com seus
filhos! Em um domingo de sol, Luana, 4 anos, surpreendeu os pais ao
indagar: "O que é morrer?" A pergunta soou como um gongo quebrando a
ordem do dia perfeito. O casal ficou sem fôlego, pois a morte, como para todo
mundo, lhe parecia um assunto indesejável - e era estranho que tivesse lugar na
mente de uma criança. O que responder a uma menina que não estava vivendo
nenhuma perda de alguém querido? O pai fez o melhor que pôde, mas se esqueceu
da pouca idade da garotinha e começou a falar, sem parar, como se lesse páginas
pesquisadas no Google e arrematou: "Depois que morremos, somos enterrados
ou cremados". "O que é cremado?", ela emendou. Por sorte, os
três já tinham chegado à casa dos avós de Luana, o almoço já estava na mesa e
todos se distraíram com outros temas.
Para começar, é bom ter em mente que, a partir dos 3 anos, a
criança já tem noção de quem está presente e ausente e seu mundo é dominado
pela imaginação. "Assistindo a Bambi ou O Rei Leão, ela vai acessar as
perdas pelo canal da fantasia. Aí notará se o bicho de estimação morreu ou se a
planta murchou. Muito antes de a criança falar disso, ela já vivencia o
tema", explica a doutora em antropologia e educadora Adriana Friedman,
fundadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Simbolismo, Infância e Desenvolvimento
(Nepsid), em São Paulo.
Então, é melhor estar preparada para lidar com esse tipo de
conversa - na verdade, mais delicada para você, que é um adulto, do que para
seu filho. "Causa pavor pensar no fim da própria vida e na perda das
pessoas mais queridas. Foi o fato de Luana questionar com absoluta inocência
sobre algo que evoca tanto sofrimento que fez o pai dela entrar num mar de
explicações. O intuito era acalmar a si mesmo para não se desorganizar na
frente da filha", diz o psicanalista e educador Wilson Klain, de São
Paulo. Nessa situação, o primeiro passo é colocar-se no lugar da criança e
responder de forma simples, como se fosse um tradutor, sem opinar ou ir além do
que ela pode compreender com a idade que tem.
Mas nada precisa ser tratado de modo trágico. Os pais
não devem esconder sua tristeza em situações difíceis, na opinião de Maria
Júlia Kovács, coordenadora do Laboratório de Estudos sobre a Morte do Instituto
de Psicologia da Universidade de São Paulo: "A questão não é evitar o sofrimento,
e sim compartilhá-lo, esclarecendo as dúvidas do pequeno. Assim, se a criança
estiver abatida, verá que os adultos também estão, e isso conforta".
Segundo ela, em alguns casos, o filho pode até "cuidar" dos pais que
enfrentam uma perda. Ele dará carinho e atenção, o que trará sensação de força.
Dos 4 aos 7 anos, já há compreensão do aspecto irreversível
da morte. "A criança entende que o vovô falecido não volta mais e o gato
que morreu não estará mais na casa. Mas não faz distinção entre o valor de perdas
humanas e animais", diz Wilson Klain. Para o expert, vale, de qualquer
forma, ensinar que os que morrem param de respirar, de caminhar, de visitar os
netos, de ir para a casa em que moravam. "Quanto mais óbvias as afirmações
dos pais, mais tranquilidade o pequeno terá. De quebra, também aprenderá sobre
a vida." Só evite criar histórias fantasiosas, como "ele virou
estrelinha". Esse tipo de frase não se sustenta. A criança, sim, pode usar
o recurso da fantasia, inventando uma explicação mágica para ajudar na própria
compreensão. Mas isso só adianta se partir dela.
Dos 9 anos em diante, e principalmente depois dos 11, é
ainda mais indicado fugir de tudo o que é fantasioso, pois, em vez de explicar,
a saída causa desconfiança. "Nessa fase, pode surgir um bombardeio de
perguntas sobre a vida e a morte, e os pais precisam ter amadurecido isso para
responder à altura", afirma Klain. "É hora de compreender a vida de
modo mais científico. Então, busque respostas na biologia ou na história das
religiões, inclusive, dizendo que cada cultura encontra sua forma de lidar com
as perdas."
Esconder das crianças assuntos delicados, como separação e
morte, privando-as de qualquer papo sério, tende a formar adultos muito
frágeis. "Conviver com as frustrações faz parte da vida e é um longo
aprendizado", explica o psicanalista Wilson Klain. Não importa se a
questão é o abandono da chupeta ou a perda de uma pessoa próxima. Para a
criança, nunca é fácil. Mas o adulto precisa encarar a situação. "É uma
forma de evitar que os filhos se transformem em adultos que ficam paralisados
diante de pequenos fracassos, são deprimidos ou têm bloqueios sérios. Esse tipo
de sofrimento, sim, pode ser evitado."
Material de apoio
Livros para abordar o tema de forma mais leve e até
divertida
1. O Pato, a Morte e a Tulipa, Wolf
Erlbruch (Cosac Naify): o protagonista é perseguido pela morte desde o
nascimento.
2. Meu Filho Pato e Outros Contos sobre
Aquilo de Que Ninguém Quer Falar, vários autores (Cia. das Letrinhas): seis
histórias com acontecimentos da vida da criança que ajudam a crescer, como a
chegada de um irmão e a perda de alguém muito querido.
3. Histórias da Cazumbinha, Meire Cazumbá
e Marie Ange Bordas (Cia. das Letrinhas): a narrativa é baseada em fatos reais.
4. Menina Nina, Ziraldo (Melhoramentos):
a morte da avó é o ponto de partida dos diálogos.
5. Não É Fácil, Pequeno Esquilo, Elisa
Ramon (Callis): trata de sentimentos como saudade, após o esquilo do título
ficar sem mãe.
6. A Velhinha Que Dava Nome às Coisas,
Cynthia Rylant (Brinque Book): "dar nome" é um modo de nos
aproximarmos das coisas, inclusive das mais doloridas.
7. O Dia em Que a Morte Quase Morreu,
Sandra Branco (Salesiana): após uma briga, as personagens Vida e Morte
permanecem ligadas para sempre.
Fonte: M de Mulher