Fofura, sim. Obesidade, não

Nas últimas décadas, o excesso de peso entre crianças de 5 a 9 anos saltou aproximadamente cinco vezes no Brasil. Hoje, um em cada três pequenos está gordinho, com grandes riscos de, futuramente, sofrer com doenças de gente grande: colesterol alto, diabetes e problemas do coração. "Com o crescimento do PIB e da oferta de alimentos, fizemos uma transição. Passamos de uma situação em que havia predomínio de desnutridos, nos anos 1970, para o domínio do sobrepeso", analisa o doutor Ary Lopes Cardoso, médico assistente do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Só que, agora, novas evidências apontam que intervir quando a criança chega à idade escolar pode ser tarde demais. Cada vez mais estudos vêm revelando que eventos ocorridos numa fase precoce da vida do pequeno, quando ele é ainda um bebê, e até antes disso, ainda no útero da mãe, podem colocá-lo no rumo da obesidade, trajetória que fica cada vez difícil alterar quando ele chega à infância e, mais complicado ainda, quando alcança a pré-adolescência e a adolescência. "Hoje, já se sabe que os primeiros mil dias de vida do bebê, contados aí o período da gestação, podem afetar para sempre a saúde dele. É como se esse período fosse uma grande janela de oportunidade, ou seja, o momento de agir", diz Bárbara Lourenço, do departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP.

As mães têm a oportunidade de influenciar diretamente o desenvolvimento de seus filhos. E as medidas são simples: cuidar da alimentação na gravidez, amamentar o filhote exclusivamente no peito durante os seis primeiros meses e dedicar muita atenção ao que vai introduzir na dieta depois disso, mantendo o cuidado de oferecer verduras, frutas e proteínas, pouco açúcar e sódio.

Confira abaixo 10 dicas valiosas...

1. Cuide do peso durante a gravidez
Não torça o nariz se o seu obstetra puxar a sua orelha e orientá-la a perder peso durante a gestação. Inúmeras evidências relacionam o peso da mãe antes da gravidez e o descontrole no ganho de quilos nessa fase ao maior peso da criança ao nascer. Um estudo norueguês, por exemplo, constatou que, para cada quilo a mais durante a gravidez, o peso do recém-nascido aumentava 22,4 gramas. E o peso do bebê ao nascer pode abrir caminho para a obesidade na infância. Manter-se em forma no pré-natal e durante a gestação é um dos maiores cuidados que as futuras mamães podem ter. Os quilos a mais também aumentam os riscos de diabetes gestacional e de aumento da pressão arterial, entre outros problemas.

2. Amamente o seu filho no peito o máximo que puder
A Organização Mundial da Saúde recomenda que o aleitamento materno exclusivo se dê até os 6 meses. Se você não puder amamentar tanto, procure seu médico ou uma consultora de amamentação para orientá-la a extrair e armazenar o leite na geladeira. Vários estudos recentes apontam uma associação entre o uso de fórmula e a obesidade já na primeira infância. "O papel da fórmula em predizer o sobrepeso do bebê aos 2 anos é bastante importante - um impacto 2,5 maior do que em bebês alimentados exclusivamente no peito não é algo que se deve ignorar. Ainda nãoconseguimos explicar exatamente a razão, mas a mamadeira muda a dinâmica da alimentação. Boa parte das vezes as próprias mães encorajam a criança a finalizar o que foi colocado ali, e ela passa a ingerir mais do que precisa. Hábitos adquiridos desde cedo tendem a permanecer. Outra coisa: a fórmula é bem mais calórica do que o leite materno", diz Ben Gibbs, professor da Brigham Young University, nos Estados Unidos, e autor do trabalho publicado no primeiro semestre na revista médica Pediatrics Obesity.

3. A hora da papinha
Não dê papinha antes dos 4 meses. "Aos 6 meses, é hora de introduzir frutas amassadas ou raspadas e papas salgadas no almoço. Aos 7 meses, pode-se dar também no jantar", explica Anna Chiesa. A papinha deve conter todos os grupos de alimento: carne (num primeiro momento, serve-se apenas o caldo), leguminosas, cereais e carboidrato, que pode ser arroz ou macarrão. "Não bata os ingredientes no liquidificador. O ideal é que a criança comece a ter contato com a textura dos alimentos desde cedo. À medida que os dentes vão nascendo, a papa pode ter mais e mais pedacinhos para que ela aprenda a moê-los." As papinhas salgadas podem ser congeladas e depois descongeladas em banho-maria ou no micro-ondas. Já as de fruta devem ser preparadas na hora.

4. Comida é para alimentar, não para confortar
Choro de fralda molhada ou de que algo está errado é diferente de choro de fome. Aos poucos, você aprenderá a distingui-los. Evite a todo custo oferecer alimentos, especialmente doces, quando o seu filho estiver aborrecido. Crianças que se acostumam com isso podem se tornar adultos que apelam para o açúcar quando estressados.

5. Tente, tente, tente
"O ser humano tende a ter uma aversão inicial a alimentos que ele não conhece. Não seria diferente com o bebê", afirma a psicóloga Christine Bruder, de São Paulo. Por isso, não desista se ele não aceitar alguma coisa oferecida. "Estudos dão conta de que pode levar de 14 a 21 vezes até que a criança aceite aquele alimento. O ideal é que a mãe busque formas alternativas de prepará-lo", explica Tamara Lazarin. Outra dica importante: quanto maior a variedade de sabores oferecida, mais a criança vai incrementar seu repertório gastronômico. Você pode cozinhar diferentes grupos de alimentos separadamente e depois combiná-los de diversas formas.

6. Não se assuste
À medida que o bebê cresce, as calorias necessárias ao seu desenvolvimento sadio caem consideravelmente. Toda criança deve aprender a regular a saciedade sozinha. Portanto, não a force. Ao fazer isso, você pode estar ensinando seu filho a desconsiderar os sinais de satisfação que o corpo dá.

7. Temperos
Nenhuma papinha requer o uso de açúcar ou temperos industrializados, geralmente "bombas" de sódio.

8. Sem pressa para terminar
Deixe o filhote aprender a se relacionar com o alimento. "Permita que ele coloque na boca, esparrame a comida. É com essas pequenas experimentações que ele aprende a construir sua relação com o alimento", afirma Christine.

9. Jantar em família
A partir dos 7 ou 8 meses, procure levar um cadeirão próximo à mesa em que a família janta. Mas atenção: os pais são modelo para os filhos. Assim, procure você também colocar pelo menos um dos alimentos do prato da criança no seu. Ao observá-los comendo isso, a criança se sentirá mais estimulada a fazê-lo. Outra dica: dê umas colheradas também na papinha oferecida ao bebê e demonstre que você acha aquilo delicioso. A criança está sempre atenta à reação dos pais.

10. Discuta com o pediatra o peso do seu filho
Só ele é capaz de dizer se ele está acumulando quilos e a maneira mais saudável e indicada de reverter isso.


Fonte: Mdemulher