Projeto tatua mulheres que sobreviveram ao câncer de mama


Qual o poder de uma tatuagem? Um adorno estético, uma afirmação social, um atestado gráfico de originalidade. Cada um dá o sentido que quiser. Mas para um grupo específico de mulheres a tatuagem é sinônimo de sobrevivência. Sem nenhum exagero. Não raro, mulheres com câncer de mama tem que passar por uma cirurgia chamada mastectomia, um procedimento que consiste na retirada de partes do seio ou até mesmo do seio inteiro. Perda de tempo tentar descrever o trauma que isso causa em uma mulher. Basta dizer que a cicatriz não fica restrita à pele. 

Noel Franus é diretor da CP+B, uma agência de publicidade dos EUA. Após um caso de câncer de mama na família, Noel despertou para o problema e resolveu criar um movimento que una tatuadores e pacientes, de modo a cobrir artisticamente os seios das sobreviventes de câncer de mama.

 Arte como celebração à vida: para Noel, a função do design é melhorar a vida das pessoas //Crédito: P.INK

Batizado de P.INK (um trocadilho com a palavra pink, que signfica “rosa” e ink, que quer dizer tinta), o projeto é “uma curadoria de inspiração para desenhos, link de artistas e mensagens de apoio para mulheres buscando um controle criativo de seus corpos pós-operação”, como o próprio Noel definiu em entrevista.

Lançado oficialmente no dia 21 de fevereiro, o projeto já conta com 25 tatuadores-voluntários. Noel conta que o movimento P.INK inspirou um evento de tatuagem de Goiânia a fazer uma parceria com o Projeto Cicatrizar  e também promover a tatuagem gratuita entre mulheres que tiveram câncer de mama.

Veja abaixo como foi a conversa com o criador do P.INK

Você pode contar a história que inspirou o P.INK?

Quando minha cunhada Molly foi diagnosticada com câncer de mama, ela descobriu que a dupla mastectomia a deixaria com cicatrizes permanentes e sem mamilos. Daí ela se perguntou “se minha auréola será tatuada como parte da reconstrução, por que não começar do zero com algo novo, algo diferente?

Foi aí que eu me toquei que deve haver milhares de outras Mollys pelo mundo. Então a equipe da agência investigou o assunto e viu que, ao mesmo tempo em que isso era um problema, também era uma oportunidade de exercitar nossa criatividade. Então a gente colocou a mão na massa.

No vídeo abaixo você confere Molly contando sua história: 


Como o P.INK funciona em termos logísticos? Uma mulher interessada nas tatuagens deve fazer o que?

Nós focamos no início da jornada de uma sobrevivente – com tatuagens, inspiração e ideias. Mostramos tattoos interessantes de mulheres que passaram pela mastectomia, links de artistas e mensagens de apoio. Tudo hospedado no Pinterest.

Esse é nosso objetivo: quando sobreviventes entrarem na nossa plataforma, esperamos que ele se inspire e comece a agir. Nós damos ideias, o contato do artista e o apoio da comunidade.

Dito isso, adoraríamos receber sugestões de tatuadores com experiência em pacientes de mastectomia!

Quais são os pré-requisitos para uma mulher participar do projeto?

Eu gostaria que essa pergunta tivesse uma resposta simples. A pele de cada pessoas responde de um jeito diferente às tatuagens – as cicatrizes variam de tamanho e algumas precisam de um ano ou mais até que possam ser cobertas. As tatuagens para cobrir a falta de mamilo também tem seus próprios desafios e oportunidades. Por conta disso é que recomendamos os serviços de tatuadores familiares com esse tipo de situação.

Como tem sido a recepção das pessoas ao P.INK?

Está sendo incrível. Ver a repercussão, tanto na mídia tradicional quanto nas redes sociais, nos faz ter a certeza de que algo assim tinha que ser feito. Recentemente descobrimos que inspiramos um movimento  para tatuar pacientes de câncer de mama sem custos. Esse movimento vai acontecer no Tattoo Rock Fest (festival que acontece em Goiânia entre os dias 5 e 7 de julho de 2013).

Muitas mulheres que jamais fariam uma tatuagem se interessaram pelo projeto?

Isso sempre foi nosso objetivo. A própria Molly nunca tinha cogitado fazer uma tatuagem, mas quando a situação mudou, sua perspectiva mudou. Desafios inesperados exercem esse poder nas pessoas.

Nesse caso, mais do que nunca, a tatuagem é um símbolo de resistência?

Ah, sim. Eu tenho máximo respeito por quem decide deixar as cicatrizes como um símbolo de coragem. Isso é poder, é deles e ponto.

Ao mesmo tempo, há quem queira deixar a última marca. Eles recusam a deixar o câncer defini-los. Uma tatuagem pode ter um papel importante no processo de cura, já que dá aos pacientes a sensação de controle – algo que eles não experimentam há anos. Isso é poderoso. Acho que esse é a grande missão dos designers: melhorar a vida dos outros, às vezes de um jeito completamente inesperado.

Fonte: Galileu/Globo
Fotos: P.INK